Com precedentes de Santa Catarina e Distrito Federal, questão pode ser levada ao STJ
As incorporadoras ganharam dois importantes precedentes contra a cobrança do IPTU Predial antes da expedição do Habite-se – documento que atesta a conclusão e a regularidade de uma obra. As decisões foram proferidas pelos Tribunais de Justiça de Santa Catarina (TJSC) e do Distrito Federal (TJDF).
Com esses entendimentos divergentes em relação a outros tribunais, em especial o de São Paulo, a questão agora poderá ser levada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). No TJSP, segundo o advogado Bruno Sigaud, do Sigaud Advogados, há decisões contrárias aos contribuintes nas três câmaras que podem julgar o tema – 14ª, 15ª e 18ª.
A discussão é relevante para as incorporadoras. No município de São Paulo, por exemplo, o IPTU Predial é de 1% do valor venal do empreendimento. “São valores altos. Existe caso, por exemplo, de empreendimento imobiliário de 30 mil metros quadrados”, diz Sigaud, lembrando que, com a emissão do Habite-se, pode haver a entrega das chaves – e, a partir daí, o IPTU passa a ser pago por cada unidade.
O caso de Santa Catarina foi julgado pela 5ª Câmara de Direito Público. Os desembargadores analisaram recurso do município de Blumenau contra sentença obtida por uma contribuinte.
No pedido, a prefeitura alega que a finalidade do Habite-se não pode ser confundida com o fato gerador do IPTU. Para o município, a ocorrência do fato gerador do imposto ocorre com a conclusão da obra e independentemente da expedição do documento.
Na decisão, a relatora, desembargadora Denise de Souza Luiz Francoski, diz que, no caso, o indeferimento do Habite-se justificou-se por diversas irregularidades no imóvel, como o sistema de segurança contra incêndios, de forma que “não está apto à habitação”
Assim, acrescenta, não está preenchido o requisito do parágrafo único do artigo 238 da Lei Complementar nº 632, de 2007, porque não há “construção que possa servir à habitação, uso ou recreio”, o que leva à conclusão de que não é possível a incidência do IPTU. A decisão transitou em julgado no dia 25 de novembro (processo nº 0300016-47.2019.8.24.00
No acórdão, a desembargadora cita mais uma decisão recente, de agosto de 2021, da 2ª Câmara de Direito Público do TJ-SC. No caso, os desembargadores foram unânimes contra a cobrança do IPTU antes da emissão do Habite-se pelo município de Araranguá, em Santa Catarina (processo nº 5003804-35.2020.8.24.0004).
No TJDF, a decisão é da 2ª Turma Cível. Os desembargadores, de forma unânime, negaram a cobrança de IPTU Predial pelo Distrito Federal de um imóvel ainda sem o documento (acórdão nº 1241633).
Para Sigaud, com essas decisões, contribuintes de São Paulo, por exemplo, podem recorrer ao STJ para alegar divergência jurisprudencial sobre o tema. “A decisão recente do TJSC foi bem clara e trouxe o raciocínio condizente com a nossa tese de que não pode haver cobrança do IPTU Predial sem o Habite-se porque não existe a autorização para habitação. Não se pode fazer nada com esse imóvel”, diz.
O advogado Marcelo Tapai, sócio do Tapai Advogados, também entende que as decisões são acertadas. Ele afirma que tribunais como o de São Paulo têm entendido que o imposto incide sobre a propriedade do imóvel, regular ou não, construído ou não, muito embora a questão seja objeto de muita discussão jurídica.
Em São Paulo chegou a existir uma sentença favorável aos contribuintes, mas foi posteriormente reformada pelo TJSP (processo nº 1060658-18.2017.8.26.0053). Agora, prevalece nas três câmaras da Corte o entendimento de que o fato gerador da cobrança do IPTU predial é a data da conclusão da obra, e não a data de expedição do certificado de conclusão (processos nº 1030350-33.2016.8.26.0053; nº 1047406-74.2019.8.26.0053 e nº 1023281-71.2021.8.26.0053).
Segundo o advogado Fábio Cury, sócio no Urbano Vitalino Advogados, o TJSP entende de forma diferente em casos de invasão de propriedade. Nessa situação, afasta o pagamento do IPTU, com o posicionamento de que a invasão impede a propriedade plena do imóvel. “No caso do Habite-se, também não existe o gozo, a fruição do imóvel até a expedição do documento. E, por isso, não deveria haver incidência de IPTU”, diz.
O tema, afirma o advogado, pode ser levado ao STJ, com o argumento de que a cobrança antes do Habite-se violaria o artigo 32 do Código Tributário Nacional (CTN). O dispositivo estabelece que o IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza.
Também seria possível, acrescenta, levar a questão ao Supremo Tribunal Federal (STF). Pode -se alegar, diz, violação ao artigo 156 da Constituição. “Não posso considerar tributável porque o contribuinte não tem o domínio”, afirma o advogado.
Em nota, a Secretaria Municipal da Fazenda de São Paulo informa que “existe, na legislação municipal, dispositivo que determina com precisão o momento no qual a obra deve ser presumidamente concluída” – artigo 9º da Lei nº 15.406/2011. Dessa maneira, acrescenta, “o momento que deve ser considerado como o termo inicial da incidência do imposto não é aquele da data da emissão do Certificado de Conclusão da Obra ou da data da emissão do Habite-se, mas sim o da data da finalização da obra, informada para elaboração desse certificado”.
A secretaria ainda afirma que, “no entender do Tribunal de Justiça de São Paulo, “pouco importa a data da concessão do Habite-se, já que a legislação municipal fixa outro momento para a caracterização do fato gerador, sendo que aquele documento em nada se relaciona com o lançamento tributário e/ou o fato gerador do imposto: cuida-se de documento que apenas demonstra a regularidade da construção”.
Procurados pelo Valor , Blumenau e o Distrito Federal não deram retorno até o fechamento da edição.
Fonte: Valor