Decisão da 3ª Turma representa uma mudança de entendimento dos ministros da Corte
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que quem tentar responsabilizar sócio por dívida de empresa e acabar derrotado deve pagar honorários de sucumbência ao advogado do vencedor. A decisão representa uma mudança de entendimento do colegiado.
Até então, todas as turmas de direito público (1ª e 2ª) e privado (3ª e 4ª) da Corte tinham posicionamento de que não caberia o pagamento desses honorários nos chamados “incidentes de desconsideração da personalidade jurídica”. Nesses casos, o credor tenta alcançar o patrimônio do sócio quando não consegue localizar dinheiro ou bens da empresa deve
A medida está prevista no artigo 50 do Código Civil. Pelo dispositivo, uma cobrança só pode ser redirecionada ao sócio quando ficar comprovado que houve desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
A discussão dos honorários de sucumbência existe porque o Código de Processo Civil (CPC) não trata expressamente desses incidentes. O artigo 85 diz que “sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”. Podem ser fixados, pelo juiz, entre 10% a 20% sobre o valor da condenação judicial.
No caso, a 3ª Turma do STJ analisou recurso de uma indústria metalúrgica em recuperação judicial que tentou responsabilizar os sócios de uma empresa por uma dívida. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) entendeu que não houve desvio de finalidade para responsabilizá-los e determinou o pagamento de honorários de sucumbência.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (REsp 1925959). Ele afirma que, apesar de existirem julgamentos anteriores em sentido contrário, não há uma decisão vinculante e poderia haver a superação desse entendimento.
De acordo com a ementa da decisão, o CPC de 2015 prevê expressamente as decisões de resolução parcial do mérito, “sendo consequência natural a fixação de honorários de sucumbência”. E acrescenta que o procedimento de desconsideração da personalidade jurídica, apesar do nome, é um processo com partes, causa de pedir e pedido.
O indeferimento desse tipo de pedido, de não inclusão do sócio (ou da empresa) no polo passivo, afirma a ementa, “dá ensejo à fixação de verba honorária em favor do advogado de quem foi indevidamente chamado a litigar em juízo”.
No julgamento, a ministra Nancy Andrighi, abriu a divergência. Ela citou, em seu voto, diversos julgados da 3ª Turma em sentido contrário (AgInt nos EDcl no REsp 1.767.525/RJ, AgInt no REsp 1.933.606/SP, e AgInt no REsp 2.013.164/PR).
Para ela, o CPC, ao determinar que essa discussão seja apartada do processo principal, quis apenas que as partes tivessem direito ao contraditório (defesa prévia obrigatória). Não teve, segundo ela, o intuito de tratar o incidente como uma ação comum.
Já o ministro Moura Ribeiro, que seguiu o relator, destacou em seu voto que “o patrono da parte recorrida impediu que fosse imputado ao seu cliente um fato grave de desvio de finalidade, de modo que seria injusto não remunerar o seu trabalho pelo tempo e esforço empregados na condução do caso, além do fato de a remuneração ser uma decorrência lógica da atividade advocatícia”. Além dele, acompanharam o relator os ministros Ricardo Villas Bôas Cuevas e Marco Aurélio Bellizze.
A decisão surpreendeu advogados. De acordo com Ricardo Quass, do Souto Correa Advogados, a 3ª Turma vinha, nesses casos, decidindo desde 2020 contra o pagamento de honorários sucumbenciais. Agora, diz, com essa divergência, a questão poderá ser levada à 2ª Seção ou até mesmo à Corte Superior.
Esse novo posicionamento da 3ª Turma, caso prevaleça, afirma Quass, pode trazer um impacto enorme, principalmente para os bancos, que compram créditos a recuperar na Justiça, com deságio. “Deve impactar na análise desse crédito. Vai ser preciso ter muitas provas de fraude ou desvio de finalidade contra o sócio para não se correr o risco de ter que
Guilherme Guidi Leite, do Castro Barros Advogados, acrescenta que essa decisão poderá, pelo menos em um primeiro momento, reduzir a quantidade de incidentes de desconsideração da personalidade jurídica em execuções, cumprimentos de sentença e outras ações em que se busca a satisfação de um crédito.
Ricardo Quass destaca, porém, que esse posicionamento é o mais justo para os advogados que atuaram para defender sócios. “O advogado fez seu trabalho, livrou o sócio de uma condenação, que pode ser milionária, e tem que ser remunerado pela parte contrária.”
Fonte: Valor Econômico