Esse regime especial suspende tributação sobre série de serviços, desde que contratação esteja vinculada às exportações de mercadorias
Importante para as empresas por significar uma redução nos custos de exportação, o regime especial drawback para serviços ainda não tem data para ser regulamentado. O drawback de serviços suspende a tributação sobre uma série de serviços, desde que sua contratação esteja diretamente vinculada às exportações de mercadorias.
A modalidade, que passou a valer em 1º de janeiro de 2023, estende à contratação de serviços a suspensão de tributos da qual empresas já podem se beneficiar ao adquirir insumos destinados à industrialização de produtos que serão exportados. O drawback foi instituído pelo Decreto-Lei 37/1966, e, desde então, atualizado por diversas outras normas.
No modelo tradicional, o regime suspende o Imposto de Importação (II), o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o PIS, a Cofins e o ICMS na aquisição dos insumos. Para que a suspensão se transforme em isenção, a empresa deve comprovar que o insumo, ou um equivalente, foi utilizado em um produto posteriormente exportado. Na ausência de comprovação, o tributo não pago é cobrado acrescido de juros e multa.
Já o drawback serviços foi criado no ano passado, por meio da Lei 14.440/2022, que inseriu o artigo 12-A na Lei 11.945/2009. O dispositivo prevê a suspensão do PIS/Cofins e PIS/Cofins Importação sobre a contratação de 16 serviços, desde que diretamente vinculados à exportação de bens.
O dispositivo, no entanto, prevê que, para ser efetiva, a nova modalidade do regime precisa ser regulamentada por norma conjunta da Receita Federal e da Secretaria Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais (Secint) do antigo Ministério da Economia.
Após a troca de governo, a Secint se tornou Secretária de Comércio Exterior (Secex) e integra o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), recriado sob o comando do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin. É a Secex, portanto, que deve regulamentar a nova modalidade do drawback em conjunto com a Receita Federal.
Ao JOTA, advogados tributaristas defenderam uma regulamentação rápida. Segundo eles, o drawback serviços garantiria a geração de empregos e o ingresso de divisas no país com as exportações. No entanto, procurada, a Receita Federal não deu prazo para a regulamentação.
Conforme a Receita, a regulamentação do dispositivo que prevê o drawback serviços está “em estudo e em fase de elaboração”. O órgão disse ainda que será realizado um “esforço conjunto” com a Secex para edição do ato normativo.
Já a Secex informou que a forma de concessão, administração e controle do drawback serviços é discutida desde o ano passado com a Secretaria Especial da Receita Federal. Segundo a secretaria, além da regulamentação, o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) terá de fazer mudanças no sistema informatizado do drawback para que a nova modalidade entre em funcionamento. No entanto, a Secex reconheceu a “importância” da medida para as exportações e disse que tem se esforçado junto a atores governamentais, sem deixar de ouvir o setor privado, para que todas as providências necessárias sejam finalizadas “o mais breve possível”.
Competitividade
Segundo Gilberto Alvarenga, secretário-geral da Comissão de Assuntos Tributários da seccional no Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), outros países já adotam sistemáticas de fomento e desoneração dos serviços na exportação de bens.
Alvarenga afirma que dez países integrantes do G20, o grupo das maiores economias do mundo, permitem mecanismos similares ao drawback para a desoneração dos serviços na exportação de bens.
“Entre esses países estão concorrentes diretos do Brasil nas exportações, como Argentina e México. O benefício do drawback é um fomento à entrada de divisas e melhora da balança comercial. Dessa forma, não editar a regulamentação necessária ao início da utilização desse benefício prejudica muito a competitividade das empresas brasileiras”, argumenta.
Segundo o antigo Ministério da Economia, citando a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os serviços representam, em média, 35,7% do valor adicionado às exportações, ou seja, a desoneração teria impacto razoável para as empresas. “É uma redução do custo agregado para a empresa que exporta. Em tese, a lógica é que ela vai ter mais competitividade”, comenta Alessandro Cardoso, do Rolim, Cardoso, Viotti, Goulart Advogados.
Serviços específicos
O advogado Valter Tremarin Júnior, coordenador da área tributária e aduaneira do Souto Corrêa, afirma que o escritório vinha mantendo contato com a Secint até o fim do ano passado e as informações eram no sentido de que o ato regulamentar estava em preparação. Segundo ele, sem a regulamentação, as empresas não podem usufruir do regime para os serviços, uma vez que a própria lei prevê a necessidade de edição de um ato conjunto.
“Com o novo governo, não houve nenhuma alteração na legislação, de forma que seguimos esperando [pela regulamentação]. [O drawback serviços] vai desonerar a cadeia de produção ao suspender tributos sobre serviços diretamente relacionados à exportação de mercadorias”, observa, ressaltando que o artigo 12-A especifica quais serviços poderão ser desonerados.
Conforme a lei, os serviços passíveis de desoneração são comissão de agente; seguro de cargas; despacho aduaneiro; armazenagem de mercadorias; transporte rodoviário, ferroviário, aéreo, aquaviário ou multimodal de cargas; manuseio de cargas; manuseio de contêineres; unitização ou desunitização de cargas; consolidação ou desconsolidação documental de cargas; agenciamento de transporte de cargas; remessas expressas; pesagem e medição de cargas; refrigeração de cargas; arrendamento mercantil operacional ou locação de contêineres; instalação e montagem de mercadorias e treinamento para uso de mercadorias exportadas.
Para o advogado Diego Diniz, do Daniel e Diniz Advocacia Tributária, o governo pode demonstrar interesse na regulamentação do drawback serviços por se tratar de uma política para fomentar as exportações, com o potencial de geração de divisas para o país. “Levando em consideração o objetivo, que é fomentar a exportação, pode ser que o governo entenda, para fins de balança comercial, que, em certa medida, é positivo”, comenta.
Complexidade
Alessandro Cardoso também acredita que o novo governo tende a priorizar a regulamentação, tendo em vista a importância da política para o setor produtivo. “É uma questão que envolve vontade política e definições técnico-operacionais. Já existia uma interlocução do setor produtivo com as áreas técnicas [no governo anterior], que deve continuar existindo nesse governo. Acho que o setor produtivo vai trabalhar para que [a regulamentação] seja prioridade”, avalia. O advogado afirma que é preciso levar em conta que a regulamentação é complexa.
“É muito mais do que [editar] uma norma. É concepção de sistema, de fracionamento de serviços por custo, por quantidade. Quando eu faço, por exemplo, seguro de transporte marítimo, normalmente é um seguro de tudo. Com o drawback de serviços, se uma parte da mercadoria é para exportar e outra parte para o mercado interno, será preciso fracionar. A operacionalização é complexa”, afirma. Ele diz, ainda, que é preciso adaptar o sistema informatizado atual.
“Atualmente, não tem sistema aduaneiro para esse drawback [de serviços]. É preciso adaptar o Siscomex [Sistema Integrado de Comércio Exterior] e o sistema Drawback Web. No drawback de mercadorias, você compra insumo desonerado e vincula ao registro de exportação para dar baixa na declaração de importação no sistema. Se não comprovar a exportação, a empresa tem que pagar o imposto não recolhido com multa e juros”, explica, pontuando que é preciso definir como funcionará esse sistema para o drawback serviços.
Segundo Valter Tremarin Júnior, as discussões que os tributaristas têm acompanhado junto à área técnica do governo indicam que a nota fiscal será usada para o controle da vinculação dos serviços contratados à exportação de produtos. “O que a gente tem de notícia é que a nota fiscal vai ser o meio usado para esse tipo de controle, o que deve reduzir a margem de discussão [sobre a vinculação], com a nota relacionada a algum ciclo da cadeia de produção”.
Ampliação
Atualmente, a quantidade de empresas que se beneficiam do drawback no Brasil é reduzida. Conforme dados do Siscomex, em 2021, 2.660 companhias usaram o regime especial, em comparação com 2.451 em 2021 e 2.412 em 2019. Um dos motivos é que o regime especial abrange um universo específico de empresas: as indústrias exportadoras. Mas, de acordo com Valter Tremarin Júnior, no próprio governo federal há o reconhecimento de que mais empresas poderiam se beneficiar do regime e não o fazem.
“A própria Secretaria de Comércio Exterior, quando realiza suas palestras, sempre ressalta que o número de empresas que utilizam o regime é baixo. Várias empresas que poderiam utilizar, dos mais diversos ramos, não utilizam. Alguns ramos nem sabem que poderiam utilizar, como no caso da agroindústria. É preciso um aprofundamento no conhecimento [do regime].”
Com o drawback serviços, a expectativa é que aumente o número de empresas beneficiadas e de exportações vinculadas ao regime. Uma novidade implementada no ano passado também pode levar a um crescimento do número de empresas que utilizam o regime especial.
Em setembro, a Portaria 76/2022, da Secint em conjunto com a Receita Federal, atualizou a regulamentação do drawback e passou a permitir o uso do regime por empresas optantes pelo Simples Nacional. O Simples é um regime tributário simplificado para micro e pequenas empresas, que abrange companhias com receita bruta anual de até R$4,8 milhões.
Controle
No entanto, na visão de Valter Tremarin Júnior, para que de fato haja um aumento do interesse das empresas pelo drawback, é preciso um esforço para conscientizar sobre os benefícios do regime aduaneiro, principalmente no caso das pequenas empresas.
“Hoje, a gente sabe que muitas empresas, principalmente as menores, têm receio de promover importações e exportações. Eu acho que sim [o número de empresas usuárias do regime tende a aumentar], mas de forma muito gradativa. Vai ser necessário um trabalho do governo federal. Sempre que é implementado algo novo, a empresa tem receio de utilizar”, avalia.
Para Márcio Robson Costa, conselheiro da 3ª Seção de Julgamento do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), a baixa adesão ao drawback pode ter relação com a complexidade do regime, o que assustaria algumas empresas. Segundo ele, para usufruir do benefício do drawback a empresa deve implantar mecanismos de controle e rastreabilidade.
“O drawback fomenta muito o comércio exterior, e a baixa adesão salta aos olhos, pois é um regime muito bom. Mas para usufruir basta você ter um controle. Direito aduaneiro é controle puro. Você tem que ter o rastro de que o insumo entrou, foi usado na atividade econômica e que você está exportando. As empresas têm um temor, de repente, pela complexidade desse controle.”
Fonte: JOTA