Na última segunda-feira (22/11/2021), o Supremo Tribunal Federal formou maioria para declarar inconstitucional a fixação de alíquotas de ICMS superiores às gerais nas operações envolvendo fornecimento de energia eletétrica e telecomunicações. A matéria é objeto do Recurso Extraordinário nº 714.139, Tema 745, que está sendo julgado pelo procedimento de repercussão geral.

No caso concreto, o contribuinte impetrou mandado de segurança suscitando a inconstitucionalidade da Lei Estadual de Santa Catarina que instituiu alíquota de 25% para os serviços de energia elétrica e telecomunicações, superior à alíquota geral de 17% adotada pelo Estado. Argumentou, ainda, que tais alíquotas violam a seletividade do ICMS pois são superiores àquelas aplicadas nas operações com armas, bebidas alcoólicas e fumo.

Para melhor compreender a discussão sob julgamento, vale tecer breves comentários sobre a sistemática de fixação das alíquotas do ICMS e sobre o princípio da seletividade.

O Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, por previsão do artigo 155, inciso II, da Constituição Federal, é instituído pelos Estados e pelo Distrito Federal. Assim, incumbe ao legislador estadual fixar as alíquotas que incidirão sobre cada operação. Usualmente, fixa-se uma alíquota geral de 17% ou 18%, que será aplicada quando não fixada alíquota específica.

Para determinar se a alíquota específica será superior ou inferior à geral, inciso III do dispositivo constitucional mencionado indica a aplicação do princípio da seletividade. Por este princípio, as alíquotas do ICMS poderão variar conforme a essencialidade das mercadorias e dos serviços. Assim, quanto mais essencial, menor a alíquota, que poderá ser majorada quando se tratar de mercadoria e serviço supérfluo.

Veja-se, porém, que a Constituição Federal dispõe que o ICMS poderá (e não deverá, como ocorre com o IPI) ser seletivo. E é com base nessa suposta faculdade que os Estados defendem a possibilidade de majoração das alíquotas de ICMS para energia e telecomunicações.

Entretanto, conforme bem pontuado no voto do relator, Ministro Marco Aurélio, a faculdade da observância do princípio da seletividade é exercida no momento em que o ente tributante opta pela instituição de alíquotas específicas. Ou seja, o termo “poderá” possibilita que o Estado não adote a seletividade e fixe apenas uma alíquota geral, aplicável a todas as operações.

Contudo, a partir do momento em que o ente, criando alíquotas específicas, adota a seletividade do ICMS, é imperioso que observe a inversa proporção entre a essencialidade do bem e a alíquota do imposto. Nas palavras do Ministro: “adotada a seletividade, o critério não pode ser outro senão a essencialidade”. Portanto, entende o relator que, adotadas alíquotas específicas, o Estado deve, obrigatoriamente, fixa-las conforme a essencialidade da mercadoria e serviço.

Nesta linha, em se tratando a energia elétrica e telecomunicações de mercadoria e serviço essenciais e insubstituíveis, não se admite que o ente fixe alíquotas superiores à geral. Este entendimento foi seguido pelos Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Edson Fachin, Rosa Weber e Luiz Fux.

Por sua vez, o Ministro Alexandre de Moraes divergiu parcialmente do relator, sugerindo que a adoção de alíquotas diferenciadas não fere o princípio da seletividade quando a capacidade contributiva também for considerada na fixação das alíquotas. No seu entender, portanto, seria possível majorar as alíquotas conforme o volume de energia consumida e/ou a destinação do bem, sendo vedada, contudo, a majoração da alíquota do serviço de telecomunicação, por inexistir justificativa para tanto. Os Ministros Gilmar Mendes e Luis Roberto Barroso seguiram a divergência.

Ressalte-se que a conjugação dos princípios da seletividade e da capacidade contributiva também foi objeto do voto do relator. Contudo, em vez de defender a majoração das alíquotas, indicou a possibilidade (senão necessidade) de reduzi-las quando o contribuinte for pessoa com menor potencial econômico. Assim, não há incompatibilidade entre os princípios, e a observância de um não deve implicar na violação do outro.

O Supremo Tribunal Federal, portanto, formou maioria para decidir que as alíquotas aplicáveis para operações com energia elétrica e telecomunicação não podem ser superiores às alíquotas gerais fixadas pelos Estados.

Contudo, caso prevaleça a modulação de efeitos proposta pelo Ministro Dias Toffoli, a decisão somente produzirá efeitos a partir do início do próximo exercício financeiro, ressalvando as ações ajuizadas até a véspera da publicação da ata do julgamento do mérito. Verifica-se, novamente, a importância do ajuizamento das ações para garantir o aproveitamento das decisões proferidas pelo STF.

Por fim, vale destacar que, apesar do que fora decidido, remanesce problemática atrelada ao princípio da seletividade, vez que diversas mercadorias e produtos tidos por supérfluos têm alíquotas inferiores à geral, gerando certa contradição com o que fora decidido pelo Supremo Tribunal Federal.

A equipe da Ferreira Lima Pompei Advogados mantém-se atenta às decisões dos Tribunais, bem como a todas as mudanças legislativas, e está pronta para assessorar os contribuintes, com fito de resguardar seus direitos da melhor maneira possível.

Laura Junqueira é estagiária no Ferreira Lima Pompei Advogados. Discente do 5º ano do curso de Direito da Toledo Prudente. Pesquisadora bolsista pela mesma Universidade. Integrante do projeto Jovens Processualistas.