Com uma simples análise dos noticiários voltados ao âmbito jurídico, é possível perceber grandes discussões acerca da cobrança do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (FUNRURAL), tendo em vista os mais recentes acontecimentos, em especial aos propiciados pela Suprema Corte e pelo Senado Federal.

Com isso, o presente artigo pretende contribuir com o tema, realizando conexões entre os caminhos engendrados pelo Recurso Extraordinário 363.852/MG, e pela Resolução do Senado Federal 15/2017.

De início, de suma importância a análise pormenorizada do que fora assentado acerca da contribuição prevista pela Lei n° 8.212/91 (FUNRURAL) no aludido julgado da Corte Suprema. Alguns pontos desta decisão devem ser salientados:

1 – Não fora utilizada a sistemática de julgamento em Repercussão Geral, prevista pelos artigos 1.029 e seguintes do Código de Processo Civil;

2 – Foram julgados como inconstitucionais, entre outros dispositivos, os incisos I e II do artigo 25 da Lei 8.212/91;

3 – A modulação dos efeitos desta decisão fora requerida e posteriormente negada por ampla maioria.

Neste ínterim, é certo que o controle difuso de (in)constitucionalidade realizado neste caso, atingiu a base de cálculo e a alíquota da cobrança da contribuição em questão, ou seja, o critério quantitativo da norma.

Tendo tal decisão como escopo, o Senado Federal, utilizando suas prerrogativas constitucionais, editou a Resolução n° 15/2017, a qual suspendeu a execução dos dispositivos julgados inconstitucionais no RE 363.852.

Dessa forma, em vista de certa decisão proferida de forma definitiva pela Suprema Corte, o Senado pode, sem qualquer obrigatoriedade, editar tal ato normativo, atribuindo efeito erga omnes para a decisão visada.

Encaixando ao presente caso, o Senado Federal, ao editar a já transcrita Resolução 15/2017, estendeu os efeitos da decisão para todo o sistema jurídico pátrio, suspendendo completamente qualquer eficácia dos dispositivos que regem sobre a incidência do FUNRURAL e de sua sub-rogação. Vale dizer ser imprescindível que a Resolução cabalmente respeite o limite da decisão a que se refere, o que certamente fora feito tendo em vista os dispositivos que foram suspensos por esta.

Insurge, porém, a verificação do respeito do aludido limite acerca da retroação dos efeitos da decisão.

Tendo como escopo o fato de que a modulação dos efeitos fora rejeitada, e tendo esta, agora, efeito erga omnes, sua eficácia deve observar as regras estabelecidas para esta sistemática, qual seja o efeito ex tunc.

Sobre o tema, é possível afirmar que a eficácia normativa de uma declaração de (in)constitucionalidade em regra tem efeitos retroativos, ou seja, ex tunc, já que se refere ao próprio nascimento da norma.

Nesta toada, ao declarar a inconstitucionalidade de uma lei e sua consequente nulidade, a Corte Suprema atua como espécie de legislador negativo, reduzindo do ordenamento jurídico o texto legal daquela, o que afeta todos os atos acarretados a partir de seu nascimento.

Com tais premissas, vale repisar que os incisos I e II do artigo 25 da Lei 8.212/91 definiam a base de cálculo e a alíquota da contribuição. Em outras palavras, suspendeu-se um dos critérios do consequente da regra matriz de incidência tributária.

Nesta esteira, igualmente certo é que sem a presença de um dos cinco critérios de incidência (espacial, temporal, material, quantitativo e pessoal), tolhe-se a possibilidade de produção de efeitos da norma e sua respectiva obrigação tributária.

Em outras palavras, significa dizer que a Resolução em tela sepultou a norma inserida no sistema, retirando do nosso ordenamento jurídico a eficácia da contribuição do FUNRURAL, tendo em vista que ausentes os elementos que formam a sua incidência (sujeito, base de cálculo e alíquota) não resta margem alguma para a sua cobrança.

Há quem conteste tais afirmações embasando-se no advento da Lei 10.256/2001, que, por vez, alterou, entre outros dispositivos, o caput do artigo 25 da Lei 8.212/91.

Assim, em nada modificou os incisos I e II do mesmo artigo, tornando notório que as afirmações pontilhadas alhures sobre o RE 363.852 e a Resolução 15/2017 em nada são afetadas.

Ao mesmo passo, é ilógico sustentar que a Lei 10.256/2001 tenha reinstituído a contribuição do FUNRURAL, haja vista que esta tão somente tratou do caput do artigo 25 da Lei 8.212/1991, deixando de aduzir acerca do critério quantitativo da norma, que por ora inexiste no sistema jurídico pátrio.

O mesmo raciocínio, inclusive, pode ser utilizado acerca do artigo 30 da Lei 8.212/91, que estabeleceu a sub-rogação do adquirente, consignatário ou cooperativa, responsabilizando-os pelo recolhimento das contribuições, e posteriormente descontando o valor do produtor pessoa física ou do segurado especial.

Isso em razão do fato que o RE 363.852 também o julgou inconstitucional, e a Resolução 15/2017 do Senado também suspendeu seus efeitos. Inexiste, portanto, previsão de lei válida e vigente impondo a sub-rogação, implicando na necessidade de anulação de qualquer crédito tributário, referente ao FUNRURAL, e que utiliza a sistemática de substituição de responsabilização ora discorrida.

Tal fato faz concluir que, mesmo para quem defenda que atualmente os incisos I e II do artigo 25 da lei 8.212/91 encontram-se vigente no ordenamento jurídico, seja pela constitucionalidade assentada com base na lei 10.256/01 quanto pela Medida Provisória 793/2017, permanece a impossibilidade de cobrança por meio de sub-rogação pelos mesmos argumentos de inconstitucionalidade e nulidade supra discorridos.

Neste específico ponto também vale consignar que a Lei 10.256/01 em nada alterou o artigo em tela da sub-rogação, reforçando a inviabilidade da sustentação de que há no ordenamento pátrio a possibilidade desta sujeição tributária.

Portanto, atualmente, inexiste qualquer instituto legal que corrobore com a possibilidade de cobrança do FUNRURAL, tanto para com o produtor rural pessoa física quanto para com o segurado especial, assim como ocorre com a sub-rogação desta contribuição, tendo em vista que a Lei 10.256/2001 em nada afeta o que fora declarado no RE 363.852, e posteriormente robustecido pela Resolução do Senado n° 15/2017, implicando na necessidade de anulação de qualquer crédito tributário que se consubstancie nestes termos, observando, inclusive, a regra dos efeitos retroativos para o controle de constitucionalidade permeado no caso.

Murilo Pompei Barbosa é Advogado sócio na Ferreira Lima Pompei Advogados. Mestrando em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBET. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET. Graduado em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente/SP. Membro do LIDE Futuro – Grupo de Líderes Empresariais. Membro efetivo da Comissão de Direito Tributário da Ordem dos Advogados do Brasil, 29ª Subseção de Presidente Prudente/SP. Membro da ABRADT – Associação Brasileira de Direito Tributário.