No cenário atual é notável a existência de diversas estruturas jurídicas que buscam o maior conforto e previsibilidade acerca do patrimônio do contribuinte, através do planejamento tributário, patrimonial e sucessório, em razão das complexas estruturas normativas que geram inseguranças nas relações interpessoais.

Neste cenário, é comum a constatação de pessoas físicas, detentoras de bens imóveis, constituindo pessoas jurídicas a fim de realizar o planejamento tributário, patrimonial e sucessório, e por consequência utilizam o bem imóvel como forma de integralização no capital social.

O capital social é comumente conhecido como o valor correspondente ao custo de operação da empresa e definido pelos sócios, sendo assim, o art. 997, III, do Código Civil dispõe sobre a possibilidade de subscrever e integralizar o capital social em qualquer espécie de bens suscetíveis de avaliação pecuniária, assim como bens imóveis, pensando justamente no planejamento supracitado.

Portanto, existe a transmissão da propriedade do bem imóvel da pessoa física para a jurídica, o que poderia configurar fato gerador do ITBI, no entanto, há imunidade tributária prevista na Constituição Federal, em seu artigo 156, §2º, I. Vejamos:

O aspecto material que tange o ITBI “é o registro imobiliário da transmissão da propriedade do bem imóvel” (CASTRO, LUSTOZA, GOUVÊA, 2018, p. 965) sendo de competência municipal.

Ocorre que, não há de se falar em incidência de ITBI em casos de incorporação do bem imóvel ao patrimônio de pessoa jurídica, desde que seja observado o fator limitador de imunidade constante no dispositivo constitucional, qual seja: a atividade preponderante da pessoa jurídica não pode ser imobiliária, ou seja, compra e venda, locação ou arrendamento.

O objeto social constante no contrato social, atividades CNAE e balanços são algumas formas de comprovar a atividade preponderante da pessoa jurídica e comumente aceitas no âmbito judiciário.

Ainda, esse entendimento é reforçado pelo Código Tributário Nacional, em seus artigos 36 e 37, nos quais dispõem sobre a não incidência do ITBI sobre incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica, em realização de capital, desde que essa não possua atividade imobiliária preponderante.

Dessa forma, é constitucional dizer que não incide ITBI sobre operações envolvendo bens imóveis na realização de capital social de pessoa jurídica que não possua atividade imobiliária de forma preponderante, no entanto, surge uma problemática prática: o valor do imóvel declarado no IRPF e aquele integralizado no capital social.

Isto pois, o bem imóvel sob a propriedade da pessoa física e devidamente declarado no Imposto de Renda Pessoa Física possui valor histórico geralmente inferior ao valor de mercado ou em relação ao valor venal atribuído pela prefeitura, sendo assim, para que não haja ganho de capital e consequentemente a obrigação de pagar novo tributo o valor integralizado corresponde ao declarado no IR.

O ponto aqui era justamente essa diferença de valores, resultante da seguinte equação matemática: Valor de mercado ou Venal de referência da Prefeitura – Valor Declarado e Integralizado. Diante de tal resultado, deveria incidir o ITBI sobre qual montante, ou seja, qual o alcance da imunidade tributária?

A discussão chegou ao STF mediante o Tema 796, com o qual pacificou o seguinte entendimento em 2020 “A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do art. 156 da Constituição Federal, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado”.

Dessa forma, a imunidade tributária em relação ao ITBI foi reconhecida e limitada ao valor integralizado no capital social da pessoa jurídica, ocorre que esse valor é divergente do valor de mercado ou do referencial da prefeitura.

Assim, contribuintes levaram uma nova discussão ao judiciário, argumentando que o valor declarado no IR poderia ser utilizado como referência para a integralização no capital social, nos moldes da Lei Federal nº 9.249/95, sendo o valor da operação societária e, portanto, não haveria diferença a ser apurada para pagamento de ITBI, conforme o entendimento do STF.

Contudo, a jurisprudência, principalmente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, foi massiva no sentido de afirmar que não há qualquer relação entre a Lei Federal supracitada e a definição da base de cálculo do ITBI, sendo assim, deveria ser apurada a diferença entre a realização de capital e o valor venal para fins de incidência do referido tributo.

Ocorre que, diante deste cenário, ergueu-se uma nova problemática: a definição do valor venal por parte dos Municípios de forma arbitral. Estipulando um valor de referência da Prefeitura ou aquele utilizado para cálculo do IPTU como sendo evidentemente destoante do valor de mercado real, o que resulta em uma diferença considerável para o cálculo do ITBI devido.

Como a discussão trata-se de normativa infraconstitucional não demorou muito e chegou até o plenário do STJ, através do Tema 1.113, firmando a seguinte tese a respeito da base de cálculo do ITBI:

a) a base de cálculo do ITBI é o valor do imóvel transmitido em condições normais de mercado, não estando vinculada à base de cálculo do IPTU, que nem sequer pode ser utilizada como piso de tributação;
b) o valor da transação declarado pelo contribuinte goza da presunção de que é condizente com o valor de mercado, que somente pode ser afastada pelo fisco mediante a regular instauração de processo administrativo próprio (art. 148 do CTN);
c) o Município não pode arbitrar previamente a base de cálculo do ITBI com respaldo em valor de referência por ele estabelecido unilateralmente.

De acordo com o STJ o contribuinte deve recolher o ITBI sobre o valor da operação realizada, e somente poderá ser diferente disto quando o Município entender que há evidente má-fé ou caso o contribuinte não entregue os documentos pertinentes, mediante processo administrativo.

No processo administrativo o Município deverá apontar as razões pelas quais acredita que o valor da operação deva ser afastado, bem como deverá verificar o valor de mercado do imóvel à época da transação, não de forma arbitral, mas conforme a ABNT NBR 14653-2 em imóveis urbanos.

Caso o Munícipio se abstenha de discutir o ITBI em sede administrativa e realize o lançamento e lavre um auto de infração em face do contribuinte, este possui jurisprudência, principalmente do TJSP a seu favor, no sentido de anular o referido auto de infração para que assim seja discutido o ITBI em sede administrativa, em conformidade com o art. 148 do CTN e o Tema 1.113 do STJ.

Diante das decisões do STF e STJ, atualmente o contribuinte pode realizar um planejamento patrimonial, tributário e sucessório mais eficaz e nesse sentido a equipe Ferreira Lima Pompei Advogados está sempre atenta às decisões dos Tribunais, bem como às mudanças legislativas, e está pronta para auxiliar os contribuintes, bem como o intuito de resguardar seus direitos da melhor maneira possível.

Felipe Glovackis de Oliveira é estagiário na Ferreira Lima Pompei Advogados. Discente do 5º ano em Direito pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.